segunda-feira, 23 de junho de 2014

Vida que segue



Assim como Simone Campos que há algum tempo estreou na literatura aos 17 anos, com o livro 'No Shopping', um rapaz chamado Vitor Marques, da mesma idade, também estudante e de classe média, escreveu seu primeiro e único livro: 'Maltratado pela agressão e vitorioso pela superação'.

Se Simone havia ganhado notoriedade com seu precoce e revelador romance, Vitor Marques fez uma autobiografia comovente, mas que poucos têm conhecimento, infelizmente.

Ao contrário da trama ficcional de Simone, que levou um ano para ser escrito, abordando estilo de vida capitalista e o cotidiano dos adolescentes, Vitor, entretanto, fez suas tristes páginas pouco antes de vencer a morte, recém-saído de um leito hospitalar e ainda se recuperando dos graves ferimentos.

Mas o que levaria um garoto, descobrindo a homossexualidade, a escrever um livro?

Ele também sonhava com romances, gostava de viver aventuras, imaginava pornografias e ria das comédias, como todo garoto da sua idade. No entanto foi uma tragédia que mudou e  marcou o seu destino.

Num fim de tarde de carnaval, Vitor saiu de casa, no seu bairro da Tijuca, para procurar uma academia. Há algumas quadras da sua casa, andando pela rua, foi severo e gratuitamente espancando por um grupo de rapazes, sofrendo afundamento e traumatismo craniano, hemorragia interna e externa e quebrado a clavícula.

Mesmo bastante ferido, Vitor conseguiu chegar em casa e pedir socorro,  antes de entrar num coma profundo e permanecer meses internado, entre a vida e a morte. 

O carinho dos familiares e amigos, assim como a sua vontade de viver foram determinantes para superar a dor, os traumas e as sequelas. E lhe trouxeram a decisão de relatar num depoimento franco e direto toda violência sofrida, revelando críticas indignadas e imagens que ilustram sua lamentável e injustificável condição.

Como ele mesmo diz: 'Esse livro aborda meu grito de socorro, minhas opiniões de tudo que passei e do que muitos enfrentam, mas uns resistem e outros não. Aqui está meu passo de contribuição para a formação de uma Sociedade verdadeiramente desenvolvida.'

Apesar de tudo, Vítor não se coloca como uma vítima. E nem se sente assim. Ele é mais um cidadão desrespeitado e injustiçado com a sua tortura, que representa a ignorância e os maus tratos de um país assolado por poderosos que visam seu próprio interesse. 

Seu livro serve como uma bandeira levantada contra a eterna luta pela ignorância e descaso das minorias, dos direitos humanos - que tanto e hipocritamente se fala - e do real sentido e respeito pela vida, principalmente dos excluídos.

Se todos tivesse a coragem denunciadora e sincera de Vitor, talvez o mundo estivesse menos pior.

Eu o conheci pessoalmente e posso afirmar que ele é muito mais e maior do que isso.

Não só sobreviveu mais humano e forte, deixando um registro daquele cada vez mais distante - porém real e doloroso - passado, mas continua escrevendo as páginas do seu dia a dia, que contarão o futuro da sua verdadeira e brilhante vida.